Este artigo ilustra esses processos particulares sob o prisma do impacto da imagética e da vestimenta gauchas no tango. Em tal contexto, veremos que as tradições populares e o vestuário gaucho foram elementos-chave de um renascimento nacionalista. Tentarei mostrar que a conexão entre a vestimenta e a imagética gauchas, em tese pertencentes ao passado, também envolveu o tango — dança e música modernas criadas na Argentina nos anos 1880 e 1890 e exportadas para o mundo no começo do século XX. Examinarei aqui também a confluência do nacionalismo na Argentina com as idéias européias de exotismo na definição de um contexto em que se podia fazer referência ao tango como dança e música gauchas. Nesse período em que as elites argentinas procuravam símbolos nacionais, as relações acidentais e sinuosas entre o tango — produto urbano — e as roupas gauchas ofereceram uma poderosa solução temporária. Não foi por acaso que os europeus, particularmente os parisienses, viram o tango como "dança e música gauchas". Recorrerei à ideia de que, por meio desse deslocamento, as representações que aparentemente estão fora de época e de lugar são reforçadas e "naturalizadas". O poder simbólico repousa, assim, no processo que serve para firmar uma imagética gaucha, obscurecendo, ao mesmo tempo, as ambiguidades que o sustentam.