Este trabalho parte do pressuposto de que, ao longo dos séculos, a imagem das personagens Dom Quixote e Sancho Pança se consolida de tal maneira a converter tais personagens em um mito com forte apelo visual. Por outro lado, essa consolidação não ocorre com a imagem da personagem Dulcinéia del Toboso, a qual não assume nenhuma forma imageticamente definitiva. O objetivo é mostrar que tal fenômeno ocorre graças a dois fatores que estão intimamente relacionados: determinados expedientes cervantinos na construção dessas personagens e a tradição iconográfica da obra formada ao longo dos séculos pelos inúmeros ilustradores que recriaram as personagens de Cervantes. A partir da análise literária dos procedimentos cervantinos na construção das três personagens e do cotejo entre texto e imagens e entre imagens de diferentes séculos, chegou-se a alguns resultados interessantes: a grande força icônica e a maior pontualidade do autor ao construir os protagonistas Dom Quixote e Sancho Pança propiciam uma série de leituras das personagens que convergem em direção a uma espécie de ideogramização da dupla; paralelamente, o maior perspectivismo e imprecisão na construção da personagem Dulcinéia del Toboso resulta em uma pluralidade de leituras, dentre as quais tanto coexistem fusões e justaposições de perspectivas com recriações muito particulares da personagem.